Nos últimos meses, o nome do
Capitão Temudo tem ocupado largo espaço nos jornais e noticiários da cidade do
Recife. São as obras de alargamento e acesso do viaduto, e mais
corriqueiramente, os engarrafamentos. Na verdade, foi durante um destes últimos
que emergiu a pergunta: Quem é esse tal Capitão Temudo?
Estranhos os caminhos da
história. O modesto capitão iniciou sua
carreira como simples Rua do bairro do Cabangá. Como viaduto, alargado e
ampliado, viu seu nome lançado nos holofotes da mídia, quase um pop star do sistema viário da cidade, entre
pontes, ruas, e avenidas; tal como imperadores,
viscondes, barões, conselheiros, desembargadores e doutores, destacou-se como
viaduto. Fosse vivo o nosso capitão, deveria ser promovido a marechal, ou no
mínimo general.
Tropas holandesas avançam sobre as encostas da Vila de Olinda, 16 de fevereiro de 1630. Detalhe gravura de Claes Janszoon Visscher.
Tropas holandesas avançam sobre as encostas da Vila de Olinda, 16 de fevereiro de 1630. Detalhe gravura de Claes Janszoon Visscher.
Engraçado, também, que uma obra de concreto armado de
princípios do século XXI, nos remeta a um personagem que nasceu e viveu a 400
anos atrás. Na relação de oficiais militares que participaram da expulsão dos
franceses e conquista do Maranhão e Grão-Pará, sob
o comando de Jerônimo de Albuquerque “Maranhão”, em 1615 e 1616, destaca-se o capitão de esquadra André
Pereira Temudo, português, nascido na região do Alentejo.
Pouco mais de
uma década depois, em fins de 1629, encontramos a André Pereira Temudo, que
havia sido capitão-mor do Rio Grande do Norte (1621-1623) , servindo como um
dos três capitães de presídio, remunerados, responsáveis pela defesa da Vila de
Olinda. Naquele tempo Pernambuco estava mergulhado em grande agitação, diante
da ameaça de invasão representada pela frota holandesa que se dirigia para as
costas do Brasil, para conquistar Pernambuco. Os preparativos de defesa estavam
a cargo de Matias de Albuquerque, nomeado Visitador
e fortificador das capitanias do Norte pelo rei de Portugal.
Coube ao
capitão Temudo, juntamente com o capitão Roque de Barros Rego, a
defesa das trincheiras que guarneciam a
passagem do Rio Doce. Desembarcando os invasores na praia de Pau-Amarelo, ao
norte de Olinda, ficaram os defensores do Rio Doce com a missão de formar a
primeira linha de combate. Superados pela grande superioridade numérica das
tropas holandesas, decide o general Albuquerque recuar para o fortim de São
Francisco, na praia aos pés do convento franciscano. Por três vezes tentaram os
neerlandeses superar as defesas lusitanas, sem sucesso. Decidem entrar em
Olinda pela caminho que subia entre o colégio dos jesuítas e o mesmo convento
franciscano. Em carta dirigida ao rei dois dias depois, em 18 de fevereiro de
1630, o general Matias de Albuquerque diz que vendo as intenções dos invasores mandei-lhe ao encontro os três capitães de presídios, que lhes
resistiram bem com morte do capitão da vanguarda André Pereira Temudo, e enfim
os venceu o inimigo, e foi lançando uma marcha de gente por entre os conventos
dos padres da Companhia e São Francisco.
Segundo Duarte de Albuquerque Coelho, marquês de
Bastos, e 4º. donatário de Pernambuco,
diante dos dois mil soldados das invasoras, o capitão Temudo e seus homens
foram obrigados a recuar par o largo da igreja Misericórdia. Foi, ali no adro
da igreja que tombou o capitão ao lado de 45 de seus companheiros, no dia 16 de
fevereiro de 1630.
No local, foi afixada em 1930, uma placa de pedra com
os dizeres: Aqui, no adro desta igreja, o Capitão André Pereira Temudo, seguido de
um punhado de bravos pernambucanos, sacrificou heroicamente a sua vida, para
vingar os ultrajes que faziam a pátria e a religião os criminosos invasores
holandeses em 1630. Esta visão
ufano-religiosa, deixou para a posteridade, a imagem de um Temudo tresloucado
que se joga de espada em punho contra um bando de soldados holandeses, que
estariam a profanar os altares, bebiam nos cálices sagrados do
Templo.