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domingo, 12 de fevereiro de 2012

Tem gringo na “folia”! - Henry Koster


 Marcelo Lins
A bem da verdade, o termo gringo do título acima não se aplica de forma categórica ao inglês Henry Koster. O Filho do comerciante inglês John Theodore Koster, nasceu na cidade de Lisboa em 1793. Aportou no Recife em 7 de dezembro de 1809, a bordo do navio Lucy, vindo de Liverpool, para tratar a tuberculose que o afligia.
Criado entre Lisboa e Liverpool, Koster fugia do estereótipo do viajante estrangeiro em terras estranhas.  Falando português fluentemente, e segundo suas próprias palavras língua que me é mais familiar que a do meus país[1]. Inicialmente, estabeleceu-se no Recife, onde engajou-se ativamente na vida social e cultural da cidade, cultivou várias amizades e participou até da política local. Sentia-se tão à vontade, chegando mesmo a afirmar:  A Inglaterra é a minha pátria mas o meu país natal é Portugal. Pertenço aos dois, e na companhia de ingleses, portugueses ou brasileiros, sinto-me igualmente entre patrícios.[2]




Em Pernambuco foi senhor de engenho em Itamaracá, dono de escravos, vivendo, assim pernambucanamente.[3]  Observador atento e desprovido de preconceitos xenófobos tomou notas dos aspectos sociais, pitorescos, econômicos e geográficos do Nordeste do Brasil  e seus habitantes. Notas estas reunidas no livro Travels in Brazil, publicado em Londres no ano de 1816.
Em uma das passagens do seu livro, Koster relata os festejos de carnaval passados na ilha de Itamaracá, em 1815. Naquele ano, a chamada terça-feira gorda caiu no dia 7 de fevereiro. No sábado, Koster, em companhia do vigário, dirige-se à vila do Pilar, onde encontra já instaladas as famílias dos engenhos Macaxeira e São João. A primeira atividade, ainda no fim da tarde do Sábado, foi a apresentação de  um famoso dançarino de corda, que exibiu-se ao ar livre numa corda estendida entre dois coqueiros a grande altura. O bailarino  executou suas habilidades com ágil e considerável elegância. O espetáculo prosseguiu até tarde da noite com o dançarino rendendo homenagens aos convivas - Vou dançar pela saúde do Vigário! – recolhendo, depois, seu pagamento como de costume e com muitos gracejos junto ao homenageado.
O dia seguinte inicia-se com tradicional missa dominical na igreja da vila. Depois da cerimônia, no entanto, os paroquianos dedicam-se às brincadeiras do entrudo, devidamente registradas pelo “inglês”.
Depois que a cerimônia na Igreja terminou, o "entrudo", pilherias e artimanhas começaram e antes que esse divertimento findasse pela tarde, cada pessoa fora obrigada a mudar sua roupa várias vezes. As senhoras brincavam com alma e coração, especialmente a velha dona de Macaxeira [Engenho Macaxeira], que ia de um a outro, até que a guerra acabasse. Os padres eram tão joviais como os demais, sendo apenas notada, sua superioridade de educação. Suas pilhérias eram muito oportunas e nunca acompanhadas por qualquer brutalidade na conduta, mostrando sempre polidez em suas maneiras, mesmo quando ensopavam as pessoas que atacavam, tomam a precaução de fazer jogo claro, quando outros não eram assim felizes maior parte da luta.[4]
A segunda-feira é inteiramente dedicada aos divertimentos do carnaval, pela manhã todos despertam prontos para a ação, que dura toda a manhã e prolonga-se até as três horas da tarde. A festa continua com a teatralização de uma batalha entre mouros e cristãos. 
Na praia, um tablado de sobre estacas, montado durante a maré baixa, representa uma fortaleza moura, assediada pelas tropas cristãs. O espetáculo fora calculado para começar quando a maré estivesse bem alta, e a estrutura estivesse completamente rodeada pelas águas.
O enredo conta a história do rei Mouro que recusa o batismo, provocando o início da guerra. No mar,  numerosas jangadas e canoas, de cada facção, movimentam-se para a fortaleza no meio da água, uns para atacá-la e outras para defende-la.  A apoteose se dá com a derrota e aprisionamento do rei mouro. Uma festa,
Verdadeiramente brilhante, e a praia estava repleta de povo, com suas melhores roupas, os mais finos e caros, como sedas, cetins, musselinas, algodões estampados, enfeites de ouro e pedras preciosas, chapéus de seda e de tafetás, fitas de todas as cores e em grande quantidade, sapatos brancos, pretos e de várias tonalidades e vestidos [..., jalecos de algodão, feitos para essa festividade, coletes bordados, calças de nanquim  de outras fazendas ligeiras, chapéus altos, uns de castor, outros de palha, uns redondos, outros menores, botas altas, sapatos e sandálias.
O dia da partida era marcado pelo que Koster chamou de estranho costume. Durante a despedidas, as pessoas que ficavam reuniam-se diante das portas, munidos com  utensílios domésticos de metal, batiam um objeto contra o outro, num barulho infernal. Essa brincadeira é praticada nessas ocasiões, causando muita alegria.


[1] KOSTER, Henry, 1793-1820. Viagens ao Nordeste do Brasil. Tradução e prefácio de Luis da Câmara Cascudo; estudo introdutório e organização Leonardo Dantas Silva; 11 ed. atual. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Ed. Massangana, 2002;  vol. 1, Prefácio do Autor.
[2] Idem; vol. 2, p. 518
[3] DANTAS-SILVA, Leonardo e SOUTO MAIOR, Mário (organizadores). O Recife: quatro séculos de sua paisagem. Recife: Fundaj, Ed. Massangana; Prefeitura da Cidade do Recife, Sec. de Educação e Cultura, 1992; p. 78.
[4] KOSTER, Henry, 1793-1820. Viagens ao Nordeste do Brasil;  p. 516-517.






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